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Pés

  Estive doente durante estes dias. Agora, apesar de melhor, não me sinto plena. O frio insiste em arranhar-me a garganta e o dia-a-dia tem de continuar a ser feito. Nos últimos dias, fiz o mínimo necessário, isto é, fiz o necessário, quase tudo além disto é supérfluo. Ausente do mundo virtual, espantei-me com um fenómeno que me aconteceu e de que já tinha ouvido falar, mas, não tendo ainda acontecido comigo, parecia-me algo fantasioso, como o raciocínio de uma criança muito pequena, não vejo logo não existe. Recebi um email de um estranho a manifestar a sua vontade em querer comprar fotografias dos meus pés. Devo dizer que fiquei admirada com o valor oferecido por cada fotografia. Recebi também várias mensagens elogiosas nas redes sociais sobre os meus pés, sobre a sua beleza e encanto, como se um fenómeno que não consigo explicar lhes tivesse colocado uns holofotes em cima. Isto é, enquanto as dores no corpo e a garganta inflamada me encolheram dentro de casa durante dias, os meus

Em obras

  O estado do meu escritório e o estado da minha secretária! Os rodapés tiveram de ser substituídos. Para já foram apenas retirados e deles saíram centenas de aranhas, julgo que seriam todas da mesma família, eram exatamente iguais em tamanho, forma e cor: pequenas, mas de corpo cheio e patas musculadas, completamente pretas. Também saíram de lá bichos da conta, enrolados sobre si próprios, mas de tamanhos diferentes e cores similares. Eis a fauna que aqui vivia sem que tivesse conhecimento. Então, agora, os rodapés à minha volta estão nus e os novos estão pousados numa pilha à espera de quem vem tratar deles. As almofadas do verão que estavam lá fora, azuis, amarelas e brancas, estão amontoadas sobre do tapete. Também sobre o tapete do escritório estão dois grandes tapetes dobrados, um sobre o outro, às riscas amarelas e brancas. A arrumação das coisas do verão está a acontecer a um ritmo em que provavelmente estará tudo arrumado até ao início da primavera. Sobre a secretária tenh

Gengibre

  O outono é a minha estação do ano preferida, pena o inconveniente das infeções respiratórias, populares por esta altura. Doí-me a garganta e o gengibre, para mim, é ouro.

Manhãs

  Acordamos e, em passos leves, caminhamos até à janela, observamos o céu. É um ritual que pode ser nostálgico ou de profunda gratidão, qualquer que seja o caso ecoa as primeiras palavras do dia que dizemos a nós próprios, mesmo que não as escutemos.   Ana Gil Campos

Teias de aranha

  Tão absorta na minha ficção que quase me escapava o escândalo que o país está a viver neste momento. Se não fosse uma publicação que um primo meu fez no Instagram, estaria ausente até agora. Acabo de ligar a televisão, objeto quase sempre desligado, repleto de teias de aranha e aranhas de brincar usadas na decoração de Halloween que o meu filho fez cá por casa. É preciso limpar as teias de aranha.

Dia dois de novembro

  O vento do dia dois de novembro, exausto da própria fúria, rende-se ao sol, sorri-lhe, mas enfurece-se logo a seguir, não dá tréguas ao mar, arrasta-lhe as ondas, não dá tréguas a nada que não está entre paredes sólidas. Parece hesitar entre a chuva e o sol, indeciso e indiferente à sua indecisão, e berra, berra muito sem perder a voz, impaciente com tudo o que existe, impaciente por existir, mostra toda a força que tem com uma nota de que isto é apenas uma amostra mansa de quem poderia ser.   Ana Gil Campos

31 de outubro

  Hoje, é dia de varrer o tapete, a entrada de casa, de nos sentarmos na lua e tocarmos na profundidade da escuridão vista de cima, é dia de acendermos uma vela, ou duas, ou três, ou o número mais belo e deixarmos que os espíritos queridos nos acolham as mãos, é dia de entrarmos no espelho, naquele de todos os dias, e vermos do outro lado os olhos de bruxa, ou de bruxo, e deixarmo-nos enfeitiçar pela própria sabedoria.   Ana Gil Campos