Voo internacional

 

No passeio, admiro os vasos de plantas pousados no chão num arranjo variado. Depois de entrar pela porta aberta, há duas opções num pequeno átrio ocupado por mais vasos, a porta da esquerda que se abre no café ou a porta da direita que convida ao horto, apesar do espaço comum na parte de dentro. Mesmo que entre para um breve café a minha entrada faz-se pela porta da direita, é inevitável. Em silêncio, dou bom dia ou boa tarde a cada uma das plantas, zamioculcas, monsteras, espadas de são Jorge, pileas, begónias, strelitzias, calatheas… Toco com delicadeza numa ou noutra folha com a ousadia de quem pensa que tem permissão, mas o toque, não será importante para elas também? Talvez não. Se falassem ou reagissem fisicamente à mesma velocidade com que nós, seres humanos, somos capazes, talvez desviassem a folha e virassem costas. Contudo, sendo plantas, são menos complexas do que nós, não têm a particularidade do temperamento. Ou será que têm? Pensando melhor, cada uma tem a sua necessidade de tipo de terra, de luz, de humidade ou de ambiente seco, de estarem no interior ou no exterior. Depois, já na nova casa, mimando-as com as suas necessidades específicas, podem não se sentir bem onde as colocamos e elas vão falando, ficando doentes. Então experimentamos outro lugar e percebemos que esse é o certo quando começam a aparecer pequenos rebentos. Assim, plantas e pessoas não são muito diferentes, falamos através do próprio corpo.

Na área do café, subo até ao mezanino, a parte de baixo está praticamente cheia, apetece-me estar num espaço mais sossegado, como quase sempre. Escolho uma mesa pequena, de dois lugares. Peço um chá de lúcia-lima que chega num bonito copo de vidro picotado. Sobre a mesa, um pequeno arranjo de flores do campo. Há plantas por todo o lado, em vasos pousados no chão ou suspensos no teto. Numa mesa redonda, encontram-se quatro mulheres de origem oriental. Não sei traduzir nenhuma das suas palavras, mas conheço bem a linguagem dos seus gestos, das expressões corporais, faciais, do riso, da cumplicidade entre elas. Na mesa em frente à minha, senta-se um casal. Ela, portuguesa, fala ao telemóvel com um sotaque subtil do Porto. Depois, conversam em inglês entre eles enquanto trabalham cada um no seu portátil. Esta parte de cima do café parece uma zona de espera para voos internacionais nos aeroportos. Pessoas de origens diferentes partilham o mesmo espaço à espera do mesmo voo, continuar com a própria vida.

 

Ana Gil Campos

*Encontro no Café

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